Contabilidade Materna
A condição de mãe
faz de mim contabilista de risos.
Realizo-me quando o saldo é positivo:
quanto mais risos, melhor.
O riso é o resultado do sufoco vencido no beijo
que complementa o remédio amargo,
no colo que alivia o fardo do mau pensamento,
no afago que cala o discurso pesado,
no abraço que encerra o xingamento.
Enquanto escrevo, ouço o som dos risos dos meus filhos
socializando o quarto, o violão e todos os trecos, coloridos objetos,
livros, notebook, jogos, cacarecos,a vida, o dia, a bagunça,
o dever de casa o choro comovido, sincero ou fingido,
a contida e a espontânea alegria, o deboche, a compaixão,
a jocosa ironia, cada tudo e cada nada cada torta ou reta
manifestação do autêntico amor de irmão.
Enquanto escrevo sinto gosto de como riem
e não me atento ao que dizem
porque não me importam as palavras.
O riso é o que conta, a conta o riso é o saldo final
o riso é o sol, o açúcar, o sal.
Enquanto meus filhos riem, eu- mãe de sorrisos
e mãe de choros – vou dando por encerrado este poema
agradecendo o riso, obedecendo o ciclo, maternalmente
plenamente satisfeita, no final das contas, contadora refeita.
Ordeno que falem baixo, apaguem as luzes, não incomodem os vizinhos,
amanhã não é sábado nem domingo.
Agora ouço abafados risos entre reclamações.
Finjo não ouvir,
filhos são amáveis contestadores resmungões.
Alzira de Souza Umbelino Cardillo é escritora, cantora lírica, professora de línguas e mestranda em Literaturas de Língua Portuguesa pela PUC Minas. Nascida em Itabira, vive atualmente na capital mineira.